sexta-feira, 4 de setembro de 2020

Amar é ser ponte

 

Amar é ser ponte entre calmas.

Mesmo em tempo de ilhas sem vida, quem sabe,

Alijar dos ombros o peso de uma bagagem morta,

E assombrar pesadelos após a insônia corriqueira.


Amar é ser esse "entre", mesmo quando já desespero.

Mornas águas às quais nos entregamos e despimos,

E já sem vestes nos cuidamos de beijos.

Antes que venham os médicos, quem sabe nos curemos.


A rua serpenteia cinzenta e muda... Piscar de olhos.

Amar é só esse prenúncio orvalho, 

Pequeno retalho alaranjado que me lembra

Os dias em que na praia nos beijávamos sujos de areia.

Beliscados por besouros e grauçás, feitos concha de miçanga

Ressuscitamos tanta vez para ouvir dormentes, o vento

Em nosso dorso, confiantes de que tudo daria certo.


Desde as infâncias tem sido essa promessa de coisas distantes,

Enquanto o mundo cabia num afago.

Colhemos por breve o sol,

E o sol ancora o ritmo silvestre e doce de marulhos.

A rua torta, a rua minguante, a rua... Cheia de nervuras hostis.


É fim de tarde. E esse fim de tarde leva de volta

Pra perto da mesma casa, a mesma casa em que nos banhávamos 

Com águas de mangueira e cócegas na sola dos pés hoje mareados

De tantas ruas caminhadas. 


Mesmo assim as sensações nos desmentem,

Parece que o tempo não passou e ainda buscamos em nós 

O sinal de uma maturidade que nos console diante de tantas perdas. 

Ela não veio.


Amar perdura mesmo quando perda do amor movente.