No princípio não era o verbo, e Deus não estava com ele, ou sequer era ele.
Apenas se via imensa folia de deuses,
De luz e treva comungando indistintamente moradas sagradas.
Enfastiados de volúpia,
Viram que seria belo e bom,
Acaso se pusessem a divertir d'outro jeito,
Fazendo mundos e enviando seres para eles.
(Infelizmente, naqueles tempos não era de praxe consultar os enviados sobre as próprias prioridades)
Mas porque em verdade nem tudo fosse absolutamente belo e bom,
Nossa prioridade enquanto mera criatura
Tantas vezes fora a da mariposa capturada pelo brilho excessivo da lâmpada...
Cismados, alguns seres nascidos, talvez tenham pensado:
"Essa luz infinda nos esmaga."
E principiaram a aperfeiçoar a obra divina,
Distorcendo a seu favor a densa cor que destina, intensa de amizade e intriga...
E sonharam fazer do brilho dengo, desses que curam e afeiçoam a retina.
Mas, imperfeito e doloroso além, como são os sonhos que valem,
Permitiam que mesmo alguém sem ouvidos para deuses como eu,
Vislumbrasse qualquer coisa de eterno quando lento caminhasse.
Pois é caminhando que se enxerga o ausente e o silêncio,
Tanto mais se é noite que se estica demasiadamente.
Belo e bom seria mesmo, se o gentil se alevantasse revelando a natureza,
E da criação, que toda ranhura e cor, desejo e fauna
Em pedra, fogo, e água, pudesse amada com igual zelo.
Mas a tenacidade que nos reivindica urgente, já me seria agora suficiente:
Compassar meu caminhar para que hirto de paixão seja leve,
Mesmo se breve,
Mesmo que ainda não compreenda o manhecente verão que me abre.
E do mesmo modo, sem que tua cor me seja muito quente ou febril,
Que a roupa-aurora com que me veste preceda o verbo que me revela.
De sorte me via por entre eras, pecados e vidas, como os justos, como outros,
E como tantos, crendo eu ou não se há razão no desassossego do mundo,
Igualmente perdido seguia.
As vezes, quase sem o saber redecorava-me por fora e por dentro,
Como quem se ergue imaginando ficar a altura de objetos ansiados.
Um colorido semi-desnudo ainda me atordoa,
Sublime... Talvez o chame: "Há-de-vir"!
Fascínio humano, teimoso em ser o que tece, e a teia em que é tecido....
Assim tem sido, assim será depois que esse poema perder seu criador,
E dele já não retiver senão um fantasma das paixões, teias, e destino que o animaram.
Até porque, queiramos ou não, de flor em flor, de árvore, de pedra e espinho,
Adornos da
peregrinação dos vencidos também nos fazem silenciosamente.
Mas há esperança, pois que miúdos os visgos,
Dos tempos dos desumanos desmandos de genocidas,
Por mais que grudem, já não embotam como gostariam
Nosso sonho. Seremos mais que ontem.
Se alevanta outra vez a voz,
E nada poderá nos fazer absoluta miséria ou abatimento,
Só pelo aparente efeito devastador, quando a dor deforma.
Ai, que a dor dê forma!
Temos um instante e um grito à espreita,
Já quase brandindo em nossas vísceras,
Atávico duma fome de toda vida...
E nos cuidamos, uns aos outros, em gomos... Frágeis, tão frágeis!
Ainda assim já fomos, ainda assim, seremos...
Há distâncias que matam só pelo amor de que elas não findem.
Esse amor que sinto, amor de tudo que é humano e já não basta,
Amor sem aferição de motivos, como deve ser toda afeição.
Deslizamentos, perigos da penedia, mais um tanto de tropeços...
Entre paragens verdejantes e charcos, desertos e devaneios rios.
Caio-me inquieto no que repasso no impossível.
Estes barcos peregrinos, pequeninos,
Por favor sejam o que não fui. Amem como não amei.
Assim como talvez eu tenha amado os amores de outros
Que antes de mim reivindicaram-me para seus sonhos.
No último minuto.. . No inusitado verão... Quais dos amados deuses ou mortos voltarão?
Uau. Nossa!!! Vou ler infinitamente.
ResponderExcluirAh, poeta...
Magnífico, extasiado em como estou, faltam-me as palavras.
ResponderExcluirMaravilhoso, Moa!
ResponderExcluirProfundo!!!
ResponderExcluirseguindo, caminhando, sem cabrestos
ResponderExcluirÉ Barreto pai de Babi? Imagino seja, valeu meu caro, desse jeito mesmo, seguindo...
ExcluirGrande abraço
Parabéns.....lindo 😍
ResponderExcluirQuem é?
Excluirseguindo!
ResponderExcluirLi , reli... achei lindoo!! 🤩
ResponderExcluirSaudações pessoas queridas! Bom dia! Fico muito grato pelos comentários generosos de vocês!
ResponderExcluirPena que aqui não identifico a maioria dos que comentaram
ResponderExcluirParabéns! Muito bonita e necessária nesse momento...
ResponderExcluirValeu Mila!
Excluir"Mas há esperança, pois que miúdos, os visgos do tempo dos desumanos,
ResponderExcluirPor mais que grudem, já não embotam como gostariam
O nosso sonho. Seremos mais que ontem; se alevanta outra vez a voz.
E nada poderá nos fazer absoluta miséria ou abatimento,
Só pelo aparente efeito devastador, quando a dor deforma.
Ai, que a dor dê forma!"
Muito bom!
Valeu João Rodriques!
ExcluirMuito bom! Seremos mais que ontem mesmo! 👏👏👏👏👏👏👏
ResponderExcluirSeremos!
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