sábado, 5 de setembro de 2009

EXTRAVIO

Vou-me para um lugar que não procuro,
Eu sem destino, tu sem destino,
Esqueçamos por hora a morte.
Nesse lugar nos entendemos.
("Nesse lugar" chamado "texto")

Cumpro meus dias,
Cumpramos os nossos!
Despedindo-me de tantas bagagens que não me destinam
Com o sossego cruento de quem extraviou-se do ilusório.
Mesmo se pré-destinados às coisas vãs.
Com ou sem ganâncias, entrelamento houve
Nesse arquipélago sob estrelas.

Já não consta o bater das horas,
Os currículos e a esperança atenta
Entre os visíveis, senhores videntes da faxinaria.
Esses velhacos alegam ter recebido
De sabe-se lá de qual deus chato
Prerrogativas gananciosas sobre nosso tempo.
E também para eles já não consola
Fazer do fracasso um novo presbitério.

Olhos de aranha, olhos de insetos
Olhos negros de vermes contra vermífugos.
O que somos?
Ah, presságios humanos,
Cortejai também a estiagem.

As piruetas exercitam
Qualquer órgão vital inobservado.
E é certo que o sabemos inquieto,
Mas invisível às tecnologias médicas mais avançadas.
Vital e fantástico, propenso exercício
De saber: mais amadas que as virtudes
têm sido as vitrines. Mas se um dia as duas tiveres,
Saberás que também ambas serão insuficientes.

Esse mundo... Mudou subitamente!
Mesmo para esse animal humano que mal fez cem mil anos.
E eu que esperei acordar nos curto-circuitos duma só vida,
E encontrar intacto o mundo de ontem, feito abertura...
O que deveria levar senão a cara quebrada na porta da espera?

Há uma espécie de crueza incontida,
Encruzilhada que a poesia confessa,
Que nos ajunta e separa
Do  animal que somos entre animais outros mais velhos da Terra..
Assim foi: os seres alastraram-se
Mundo afora mediante... Sempre mediante...

Celeridade de patas, nadadeiras e asas.

Nós, animais que nos cremos,
Somos também os feitos de objetos
Que alçam vôos, calçam patas e singram oceanos.
Por vezes intangíveis animais comunicam com palavras,
E por vezes clamam por deuses
Em malhas férreas de errância.
E fitam através do precário balouçar humano.

Com as palavras, contudo, rezamos, comemos e copulamos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário